Em meio à pandemia, causada pelo vírus COVID-19, muitas mudanças estão sendo feitas em nossas legislações para amenizar o impacto, principalmente na economia, trazendo opções para empresários e empreendedores, com vistas à manutenção dos empregos e renda dos trabalhadores.
As principais mudanças, no âmbito trabalhista, decorreram da promulgação de Medidas Provisórias, como as de n. 927/20, 936/2020 e 944/2020.
Destacamos abaixo alguns pontos importantes dessas alterações, lembrando que todas as medidas mencionadas no texto abaixo, são aplicáveis também às entidades do terceiro setor.
É importante destacar, ainda, que são Medidas Provisórias, e que, portanto, devemos acompanhar as suas conversões em lei, no prazo de 120 dias a contar de suas publicações. Além disso, muitas dessas mudanças também devem ser discutidas no Judiciário, sendo também igualmente importante acompanharmos os posicionamentos dos nossos Tribunais a respeito e ajustar quaisquer iniciativas em andamento se necessário, com vistas a preservar a segurança jurídica dos acordos e medidas tomadas.
ALTERNATIVA PARA EMPRESAS QUE MANTÉM A TOTALIDADE OU PARTE DE SEUS REGIMES DE PRODUÇÃO E TRABALHO EM ATIVIDADE
“Home Office“
Quando possível, os empregadores poderão alterar o regime de trabalho presencial para o “home office” (ou teletrabalho, trabalho remoto ou à distância), durante o estado de calamidade pública, reconhecido pelo Decreto n. 06/2020, com duração prevista até 31/12/2020. Porém, é importante atentar-se para algumas regras, explicadas a seguir.
O pagamento do salário, nessa opção, deve permanecer integral, com a manutenção da jornada de trabalho. Não é necessário o pagamento referente ao Vale-Transporte, mas todos os outros benefícios como vale-alimentação, plano de saúde, dentre outros, ficam mantidos.
Fica a cargo do empregador fornecer os equipamentos necessários para o cumprimento do trabalho à distância, devendo ser objeto de acordo entre empregador e empregado o eventual reembolso de despesas e custos que serão incorridos pelo empregado em sua casa. Caso o empregado não tenha os equipamentos e nem a infraestrutura para exercer esse tipo de trabalho à distância, o empregador poderá fornecer os itens necessários via comodato, bem como pagar pelos serviços de infraestrutura, sendo que tais pagamentos não caracterizam verba salarial.
Comunicação por meios eletrônicos, mesmo que fora do horário de trabalho, não acarretará tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso. De qualquer forma, esse dispositivo trazido pela Medida Provisória n. 927 não anula o controle de jornada, de forma que, caso o empregado não ocupe cargo de confiança ou não exerça função cujo controle não seja possível, deve ser mantido o controle de jornada e horas extras, através de métodos alternativos de registro de ponto e acompanhamento dos horários incorridos pelos funcionários. Além disso, deve ser feito, pelo menos, uma Política Interna a respeito das regras que organizarão o trabalho à distância, bem como sobre as formas de cômputo das horas trabalhadas, com vistas a evitar dúvidas sobre a realização do “home office”, bem como a formação de um passivo trabalhista referente às horas extras no futuro.
Estagiários e jovens aprendizes também podem fazer “home office”, mantidas a supervisão e acompanhamentos necessários.
Impossibilidade de realização de “home office”
Para aqueles setores, áreas da empresa, negócios e indústrias considerados essenciais e autorizados a funcionar pelos Decretos Governamentais e Municipais que instituíram quarentena e isolamento social, o empregador deve manter o zelo e o cuidado com a saúde e segurança do trabalhador, o qual continua sob sua responsabilidade legal, nos termos do artigo 157 da CLT, devendo investir em campanhas de conscientização, providenciar os EPIs adequados, repensar escalas de trabalho, dentre outras medidas sanitárias, de preservação da higiene e distanciamento físico.
ALTERNATIVAS TRABALHISTAS PARA EMPRESAS QUE PRETENDEM REDUZIR OU SUSPENDER A TOTALIDADE OU PARTE DE SUAS OPERAÇÕES
1. Alternativas trazidas pela MP n. 927/20
Concessão de férias coletivas: O empregador poderá optar por conceder férias coletivas, devendo avisar o grupo de empregados afetados com antecedência mínima de 48 horas. Não é preciso atingir toda empresa, de forma que as férias coletivas podem ser concedidas por setor. Também não serão aplicáveis o limite máximo de períodos anuais nem o limite mínimo de dias corridos previstos na CLT.
Antecipação de férias individuais: Caso o empregador possua empregados que ainda não atingiram a data de início do período de gozo de suas férias, tem agora expresso respaldo legal expresso autorizando-o a antecipar as férias individuais desses empregados, dentro do período de calamidade pública (até 31/12/2020). Para tanto, é necessário comunicação ao empregado por meio eletrônico ou escrito no prazo mínimo de 48 horas e a indicação do período a ser gozado pelo empregado, que não pode ser inferior a 5 dias. Deve-se dar preferência aos empregados que compõe o grupo de risco, quais sejam os idosos e portadores de doenças crônicas. O prazo para pagamento das férias foi alterado para o 5º dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias, e o pagamento do adicional de um terço de férias pode ser até a data em que seria pago o 13º salário.
Antecipação dos feriados não religiosos: A Medida Provisória 927 permite que, no prazo que durar a calamidade pública, os empregadores antecipem os feriados não religiosos (os feriados religiosos somente poderão ser antecipados com a anuência expressa do empregado em acordo individual escrito), desde que seja enviada notificação escrita (pode ser eletrônica) ao empregado em até 48 horas, indicando os feriados que serão aproveitados.
Banco de horas: Durante o prazo de calamidade pública, fica autorizada a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, estabelecido por meio de acordo individual ou coletivo, para compensação das horas extras no prazo de até dezoito meses, contados da data de encerramento do estado de calamidade pública.
2. Alternativas trazidas pela MP 936/2020
Redução proporcional de jornada de trabalho e salário:
A MP 936 institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda (PEMER), concedendo ao empregador, durante a duração do estado de calamidade pública, a possibilidade de acordar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salários, desde que obedecidos alguns requisitos legais, bem como prevê o pagamento de um benefício estatal, pago pela União, a título de compensação pela redução do salário.
De acordo com a recente MP 936/2020, os requisitos para tal acordo são:
- duração máxima de 90 dias;
- pactuação por acordo individual ou coletivo, o qual deve ser formalizado por escrito e entregue ao empregado com pelo menos dois dias de antecedência, e informado ao Ministério da Economia e ao Sindicato Patronal no prazo de até 10 dias corridos contados da data da sua celebração;
- deve ser mantido o valor do salário-hora;
- a redução implica em garantia provisória no emprego durante o período de redução e após o restabelecimento da jornada, pelo mesmo prazo da redução (ex.: reduziu jornada e salário por dois meses – o empregado tem estabilidade pelo prazo de dois meses da redução, mais dois meses após o retorno integral às suas atividades, totalizando quatro meses);
- limites de redução nos seguintes percentuais: 25%, 50% e 70%;
- os acordos de redução nos percentuais de 50% e 70%, mediante acordo individual, só podem ser adotados para empregados com salário até três salários mínimos (R$ 3.135,00), ou para empregados portadores de diploma de nível superior, e que percebam salário igual ou superior a duas vezes o teto dos benefícios da Previdência Social (R$ 6.101,06 x 2 = R$ 12.202,12);
- em caso de acordo coletivo, os redutores de 25%, 50% e 70% podem ser aplicados em qualquer faixa salarial,
O valor do benefício emergencial a ser custeado pela União corresponde ao percentual da redução de jornada e salário, calculado sobre o valor do seguro desemprego, adotado aqui como valor referência, que hoje vai de no mínimo um salário mínimo ao valor máximo de R$ 1.813.03, a depender da faixa salarial do empregado. Assim, por exemplo, no caso de redução de 50% de jornada e salário, o empregado receberá 50% do seu salário custeado pela empresa, e 50% do valor do seguro desemprego a que teria direito pago pela União.
O valor emergencial começará a ser pago no prazo de 30 dias, contados da celebração do acordo, e desde que o empregador informe o acordo celebrado dentro do prazo de 10 dias mencionado acima.
Os efeitos da redução se encerram no prazo de dois dias contados do fim do prazo de calamidade pública, ou da data prevista como encerramento no acordo individual, ou da data de eventual comunicação do empregador determinando a cessação do período de redução.
Suspensão do Contrato de Trabalho
Seguindo na linha do propósito ao qual foi criada, qual seja o de auxiliar as empresas e seus empregados na manutenção de emprego e renda, a MP 936 também traz a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho, hipótese que havia sido aventada já na publicação do texto da MP 927, mas que restou revogada, e agora ressurge na MP 936, com condições e requisitos melhor desenhados.
Sendo assim, elencamos abaixo as regras, condições e requisitos da Suspensão do Contrato de Trabalho:
- duração máxima de 60 dias;
- possibilidade de fracionamento em até dois períodos de 30 dias;
- pactuação de acordo individual ou coletivo, escrito, a ser formalizado e entregue ao empregado com até dois dias de antecedência, com informação do acordo celebrado ao Ministério da Economia e ao Sindicato Patronal no prazo de 10 dias contados da data de sua celebração;
- durante a suspensão o empregado continua recebendo todos os benefícios (com exceção do vale transporte que poderá ser suspenso);
- durante o período da suspensão o valor do benefício emergencial a ser pago pela União é o correspondente a 100% do seguro desemprego a que o empregado teria direito (entre o valor de um salário mínimo e o teto de R$ 1.813,03), para os empregados de empresas cuja receita bruta do ano de 2019 tenha sido inferior a R$ 4.800 milhões;
- o valor do benefício emergencial a ser pago pela União para os empregados de empresas cuja receita bruta no ano de 2019 foi superior a R$ 4.800 milhões é o correspondente a 70% do valor do seguro desemprego a que o empregado teria direito, dentro das faixas acima especificadas;
- empresas com receita bruta anual superior a R$ 4.800 milhões no ano de 2019 devem pagar ajuda mensal compensatória a seus empregados com contrato suspenso no valor correspondente a 30% do valor do salário do empregado;
- a ajuda compensatória a ser paga pelas empresas não tem natureza salarial e não integra a remuneração para qualquer efeito;
- os acordos individuais só podem ser adotados para empregados com salário até três salários mínimos (R$ 3.135,00), ou para empregados portadores de diploma de nível superior, e que percebam salário igual ou superior a duas vezes o teto dos benefícios da Previdência Social (R$ 6.101,06 x 2 = R$ 12.202,12);
- os efeitos da redução se encerram no prazo de dois dias contados do fim do prazo de calamidade pública, ou da data prevista como encerramento no acordo individual, ou da data de eventual comunicação do empregador determinando a cessação do período de suspensão;
- durante o período de suspensão o empregado não poderá permanecer trabalhando, seja parcialmente, seja remotamente ou à distância;
- a suspensão implica em garantia provisória no emprego durante o período de suspensão e após o restabelecimento das atividades normais, pelo mesmo prazo da suspensão.
MEDIDA PROVISÓRIA n. 944/2020
O governo federal também criou uma linha de crédito de R$ 34 bilhões para garantir o pagamento dos salários em empresas com receita anual entre R$ 360 mil e R$ 10 milhões durante a pandemia do coronavírus. Para ter acesso ao Programa Emergencial de Suporte a Empregos, o empresário fica impedido de demitir funcionários sem justa causa no período entre a contratação do empréstimo e até 60 dias após o recebimento da última parcela da linha de crédito. Se descumprir a determinação, ele é obrigado a antecipar o pagamento da dívida.
O Programa Emergencial de Suporte a Empregos é destinado a empresários, sociedades e cooperativas. A linha de crédito deve ser usada para cobrir toda a folha de pagamento por um período de dois meses, até o limite de duas vezes o valor de um salário mínimo por empregado. Para ter acesso ao dinheiro, a empresa deve ter a folha gerida por uma instituição financeira inscrita no Banco Central.
De acordo com o texto, 85% do valor de cada financiamento é custeado com recursos da União. Os 15% restantes ficam a cargo das instituições financeiras. Os bancos podem formalizar as operações de crédito até o dia 30 de junho e cobrar taxas de juros de até 3,65% ao ano. O prazo para o pagamento é de 36 meses, com carência de seis meses.
SUSPENSÃO DE PAGAMENTOS DE FGTS
A MP 927/2020 ainda suspende a exigibilidade de recolhimento do FGTS pelos empregadores no que se refere às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, independentemente do número de empregados, do ramo de atuação e do regime de tributação. Os valores poderão ser pagos somente a partir de julho de 2020, em 6 parcelas, no dia 7 de cada mês vindouro, sem juros, multa e correção monetária.
CONCLUSÃO
Todas essas alterações visam amenizar os impactos desta pandemia à economia e aos empregos.
Destacamos que essas alternativas legais trazidas vieram na forma de Medidas Provisórias, dada a urgência e a necessidade do momento. Sendo assim, é importante acompanharmos a validade dessas normas e suas possíveis conversões em lei no prazo de 120 dias a contar de suas publicações.
Por fim, considerando que essas medidas trazem mudanças drásticas na relação de emprego, algumas delas conflitantes com o texto constitucional, é importante agir com sabedoria e serenidade, acompanhando os posicionamentos das nossas cortes a respeito das discussões que já estão sendo levadas ao Judiciário, ao mesmo tempo em que se busca a implementação dessas propostas com vistas à manutenção dos postos de trabalho e renda.
Estamos à disposição para esclarecer quaisquer dúvidas sobre os temas apresentados nesse texto, bem como para ajudar sua empresa a implementar esses dispositivos na prática.
Equipe Olivetti & Regina Sociedade de Advogados